domingo, 17 de fevereiro de 2008

Enguias

As grandes chuvadas de inverno invadiam os campos do arroz, as valas enchiam-se de água barrenta, e os pequenos rios convidavam os mais experientes à pesca das enguias.
Peixe muito cobiçado pelo seu ensopado, ou fritas como petisco, ou numa boa caldeirada.
De tarde colocavam as narças submersas nas valas ou nos rios, de modo a que ninguém visse o local exacto, porque havia sempre alguém à espreita para roubá-las durante a noite, e de manhã iam levantá-las com o saco cheio do delicioso peixe. Outros utilizando a sertela, uma técnica mais rudimentar, sempre conseguiam pescar algumas.
Quando alguém tinha a sorte de apanhar enguias em excesso, convidava logo os amigos mais próximos e, juntos, cada qual contribuindo com o seu jeito de cozinheiro, faziam à noite uma bela caldeirada.
O local escolhido para o banquete era sempre a adega, um local espaçoso, onde podiam ter todos os tipos de conversa, longe das crianças e das mulheres.
O grande tacho de cobre era colocado ao centro da mesa, com as batatas e cebolas às rodelas, enguias cortadas aos bocados a nadar naquele delicioso caldo amarelo, onde muitos gostavam de molhar o bocado de pão para provar, antes da refeição começar, para fazerem peito a um copo de tinto, tirado ali ao lado do tonel pelo espicho.
O Ti Joaquim nunca fora moço de ir às enguias, mas nem por isso deixou de comer algumas caldeiradas.
Quando sonhava que alguém nas redondezas iria dar uma caldeirada aos amigos, combinava com o irmão.
- Olha, hoje temos caldeirada!
À hora certa, o Ti Joaquim batia ao portão da adega e, perguntava ao dono da casa pelo seu irmão. Este respondia-lhe que o não tinha visto, que ali não se encontrava. Mas já que ali estava, convidava-o a entrar para comer umas enguias. Ao que ele se fazia um tanto esquisito, mas lá aceitava. Sentado à mesa, daí a alguns minutos aparecia o irmão a perguntar por ele. O dono da casa para não criar ali uma desfeita convidava-o a entrar e fazer parte do grupo…

“Onde se senta um português, sentam-se dois ou três”.

(continua)

7 comentários:

Tiago R Cardoso disse...

excelente, faz-me lembra os tempos em que a minha mãe, natural de Aveiro, fazia uma enguias fritas, que eram um espectáculo, bons tempos...

quintarantino disse...

Eu fritas ainda vá lá, mas lá quanto ao sentarem-se dois ou três onde se senta um ...

jo ra tone disse...

“Onde se senta um português, sentam-se dois ou três”.

Quero dizer!

Quando estão sentados à mesa, de volta do tacho, há sempre lugar para mais um que apareça.

O português é muito traiçoeirooooo!

"Português"! (lingua, escrita...

Boa semana

Julio Rodrigues disse...

As melhores enguias eram certamente aquelas feitas em molho de escabeche!
(na minha humilde opiniao).

Votos atrasados de um feliz aniversario.

Rosa Maria disse...

ai como eu adoro enguias fritas.
Ensopada também não é mau, com umas folhinhas de hortelã...

Beijos

Isamar disse...

O Ti Jaquim n�o ia �s enguias mas comia umas boas caldeiradas. Olha , eu tamb�m sou assim.

Amigo, tens um desafio no meu blogue. Eu sei que tu n�o �s menino de desafios mas v� l� colabora. Gostava de conhecer esses gostos de adolescente.

Jinhosssssss

luar perdido disse...

Desculpa mas quem não gosta de uma bela caldeirada de enguias? Ou das "lapiseiras fritas"???? Eu adoro!!! Acho que dou razão ao Ti Joaquim, convidada à força, mas lá perder a caldeirada....

Beijo grande